E continua a destruição do ensino público, embora este ministro esteja a conseguir fazê-lo muito mais depressa que os anteriores.Governo abre a porta a que o ensino secundário passe a ser pago
Primeiro-ministro anuncia "co-pagamento" em níveis de ensino que são gratuitos. Professores alertam para desigualdades e possível aumento do abandono escolar.
O Governo prevê mudanças no financiamento da educação e a proposta que coloca em cima da mesa é o “co-pagamento em níveis de ensino que hoje são gratuitos”, disse o primeiro-ministro Pedro Passos Coelho, quarta-feira à noite, em entrevista à TVI.
As reacções não se fizeram esperar. As principais federações de professores – FNE e Fenprof – mostram-se claramente contra. Mas o constitucionalista Bacelar Gouveia diz que a hipótese pode ser possível e que não colide com a Constituição da República (CR).
O constitucionalista Costa Andrade considera que a cobrança de taxas de acesso ao ensino secundário não é inconstitucional. “Ao estabelecer a obrigatoriedade da frequência do secundário, a lei andou à frente da Constituição, porque esta só garante a gratuitidade universal no básico”, diz ao PÚBLICO. Em relação aos restantes graus de ensino, precisou, “a CR diz que o Estado deve estabelecer progressivamente a gratuitidade, o que significa que esta depende dos meios de que o Estado dispõe”.
“Ora, o Estado somos nós, os contribuintes, e há limites à compressão fiscal. Até que ponto é que a sociedade está disposta a pagar ainda mais impostos para assegurar as prestações sociais?”, questiona. Na sua perspectiva, o Estado está obrigado, sim, “a criar condições de igualdade de oportunidades no acesso ao ensino secundário e superior, o que significa que tem a obrigação de suportar a gratuitidade deste no caso das famílias que não têm possibilidade de o pagar e na medida em que não têm essas possibilidade”.
Também o constitucionalista Bacelar Gouveia sublinha a separação que o texto constitucional faz entre ensino básico – “em relação ao qual a Constituição estabelece a regra de ser absolutamente gratuito” – e os ensinos secundário e superior para os quais a Constituição “não é taxativa” e “apenas diz que o Estado deve estabelecer progressivamente a gratuitidade. O progressivamente aqui é adaptável em função das condições económicas e sociais”, frisa em declarações à Lusa.
Bacelar Gouveia entende que cobrar o ensino secundário é um assunto que tem de ser visto com “delicadeza, proporcionalidade e igualdade”, e que a introdução de uma taxa moderadora deve ter em consideração que os alunos do secundário ainda não têm rendimentos próprios e que “pode ser difícil para as famílias cumprirem com o ensino secundário obrigatório que não seja gratuito”.
Desigualdades e abandono
O ex-ministro da Educação socialista Júlio Pedrosa sublinha as desigualdades do país. “Estamos a dar um passo no sentido inverso àquele que devemos dar. A educação secundária deve ser de grande qualidade, na fase em que estamos deve crescer o acesso à educação secundária através da educação profissional e isso deve ser aberto aos portugueses em geral, sem condicionalismos”, defende.
“O que o primeiro-ministro defendeu ontem [quarta-feira] foi não só que as famílias devem passar a pagar o ensino e a escolaridade que é obrigatória até ao 12.º ano – recordo que no superior as famílias já pagam e de que maneira –, mas provavelmente também as misericórdias, através da passagem de transferência de responsabilidade na educação para outras entidades que não o Estado”, interpreta Mário Nogueira, secretário-geral da Fenprof. É a “destruição da escola pública”, pelo menos como a Constituição a consagra, alerta.
João Dias da Silva, secretário-geral da FNE, também se mostra apreensivo e considera preocupante a introdução de propinas no secundário, sobretudo num país com baixas qualificações e onde 32% dos alunos pertencem a famílias de “muito baixo” estrato social, económico e cultural. “Esta situação vai fazer com que em vez de se combater o abandono escolar se esteja a criar condições para promovê-lo, que os nossos jovens abandonem a escola por incapacidade das famílias em os manter no sistema educativo sobretudo ainda tendo de pagar para o frequentar”, alerta. Dias da Silva defende ainda que o “Estado tem a responsabilidade de oferecer a escolaridade obrigatória gratuita”.
“À partida, não me parece que, pelo facto de ser obrigatório [o ensino secundário] seja impossível cobrar, ou que seja necessariamente gratuito. Não me parece que haja uma ligação entre os dois conceitos”, avalia Bacelar Gouveia, ainda que admita que a obrigatoriedade do ensino secundário possa colocar problemas na introdução de taxas moderadoras.
Para Júlio Pedrosa o caminho não se faz desinvestindo na educação e há outras soluções que não passam por taças moderadoras mas por gerir e administrar de forma mais eficiente a oferta de escolas, referindo, a título de exemplo, a necessidade de readequar a rede escolar ao que foram as migrações internas da população nas últimas décadas.
Durante a entrevista, Pedro Passos Coelho disse que a Constituição da República permite mais alterações às funções do Estado no sector da educação do que no da saúde. "Isso dá-nos aqui alguma margem de liberdade, na área da educação, para poder ter um sistema de financiamento mais repartido entre os cidadãos e a parte fiscal directa que é assegurada pelo Estado. Do lado da saúde temos menos liberdade para isso", considerou.
O primeiro-ministro disse, em entrevista à TVI, que o Governo tem em cima da mesa para o corte de “pelo menos” quatro mil milhões de euros na despesa pública mudanças no financiamento da Educação, uma vez que a Constituição “não trava mudanças no financiamento do sistema educativo que pode assim passar a ser semi-público com a introdução de co-pagamentos nos níveis de ensino que hoje são gratuitos”.
Fonte: Público
Governo abre a porta a que o secundário passe a ser pago
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Re: Governo abre a porta a que o secundário passe a ser pago
Hoje o Passos Coelho veio dizer que não se verificará o pagamento de taxas no ensino secundário ou o co-financiamento do ensino obrigatório, dado que "O ensino secundário praticamente desapareceu, na medida em que o ensino obrigatório foi estendido até ao 12.º ano. Uma vez estendido até ao 12.º ano, significa que as regras serão as mesmas em todos os níveis do ensino obrigatório".
Como este governo anuncia medidas num dia, diz que não é verdade no outro e depois faz o que quer, vamos lá ver o que diz para a semana
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Re: Governo abre a porta a que o secundário passe a ser pago
Finalmente começam a admitir que o objectivo é investir no ensino privado. Só assim se conseguem justificar as medidas destrutivas a que o ensino público tem sido sujeito...Aumento de propinas e apostar no privado
O relatório do FMI realça o facto de apenas um quinto do financiamento do ensino superior partir das propinas. O Estado gastou 1500 milhões de euros em 2011 nesta área. O relatório que está a ser analisado pelo Governo tem uma direcção clara: o aumento de propinas para os estudantes universitários como forma de reduzir a despesa.
“Para alcançar poupanças significantes e duradouras e reduzir o subfinanciamento, Portugal precisa de reduzir a despesa pública com o ensino superior e aumentar as propinas”, lê-se no relatório do FMI, segundo o Jornal de Negócios.
As sugestões para a poupança passam também por uma reorganização no ensino obrigatório. Pelas contas do FMI, o Estado consegue poupar cerca de 400 euros por aluno numa escola privada com contrato de associação. Alargando o cálculo aos 1,5 milhões de estudantes do ensino primário e secundário, o Estado tem diante si um caminho de 580 milhões de euros em poupança anual se apostar nos contratos de associação.
Fonte: Público