fonte: DN"Olá a todos. Faço sexophone apenas com uma câmara de telemóvel, mas só se me carregarem o telemóvel." Não foi omitida nenhuma vogal e todas as palavras estão devidamente acentuadas, ao contrário do que aconteceu no original. O anúncio podia estar nas páginas de classificados de um jornal, mas foi expressa online numa sala de chat portuguesa, aberta a quem quiser entrar. A autora da frase tem 14 anos e responde pelo nickname de Dina. "Va gajux gaja 14 anos torres novas; atao rapaxex? gajux bonx teclam??" Agora é Karol quem assina. A mesma idade, mas uma linguagem descodificável apenas para os habituais nas salas de chat, ou chat rooms.
Dina, Karol, mas também Pipa, Gatolindo ou Damadamuxgueira são protagonistas e autores de um argumento que conta uma história de encontros virtuais com perigos escondidos. São narradores na primeira pessoa de um livro com centenas de diálogos e alguns monólogos que estará nas livrarias dentro de duas semanas. Chama-se O Abominável Mundo dos Cibernautas (Gradiva) e pretende, segundo os autores, ser um alerta.
Tal como Dina, "há raparigas com 14 anos a fazerem sessões de strip e masturbação perante as câmeras web em troca de carregamentos de dez euros no telemóvel, para pessoas que não sabem quem são", escreve Renato Montalvo, um dos autores, no prefácio do livro. "Há que alertar as pessoas para esta realidade. Qualquer jovem tem acesso livre a páginas de conteúdo pornográfico", declarou ao DN, atirando um número: durante os dias 9 e 14 de Março deste ano, 78 por cento dos visitantes de chats que se identificaram ao longo das conversas eram estudantes.
Renato Montalvo e Conceição Monteiro, um ex-jornalista e uma professora de Filosofia do ensino secundário, passaram mais de 70 dias de olhos postos nas chat rooms, numa média de quatro horas diárias, e publicam agora uma selecção das conversas a que tiveram acesso. "Somos uns compiladores apenas," apresenta-se Renato Montalvo, que remete para "os especialistas em educação, sociologia, psicologia" a análise do conteúdo. "Mais do que respostas, a intenção foi levantar questões", acrescentou.
Elegeram como objecto de estudo as salas de chat do AEIOU (a Blá-Blá, a Cupido, a Kamasutra) e usaram o Windows Live Messenger, mais conhecido por MSN. Motivo da escolha: "o AEIOU é dos sites mais moderados e dos que apresentam mais nuances e oportunidades para um observador". Um e outro foram espectadores que reservaram a si a selecção de textos. "São textos de adultos e de adolescentes que dão o ambiente que se vive em cada sala." Essa selecção, garantem, passou pelo filtro da moderação. Ainda assim, afirma Renato Montalvo, "o que aqui está é chocante."
E pode ser confundido com puro voyeurismo. Por isso, ponderaram editar ou não, sobretudo depois de receberem uma carta de um psicólogo a recomendar-lhes contenção. "Qual era a alternativa? Não falar?", interroga-se o autor. Ele mesmo responde. "Não dizer nada era uma opção. Pensámos escolher os textos menos agressivos, mas ser mais brando é como os caldos de galinha. Decidimos mostrar a realidade sem cortes nem censuras. A nossa participação foi coligir textos e somos responsabilizados pela escolha." Foram publicados cerca de dois por cento dos diálogos que poderiam aparecer no livro. E, garante Montalvo, "não foram os mais hard."
O medo da chantagem
Grátis, de acesso fácil, o erotismo está virtualmente ao alcance de todos. Adultos ou menores. "O problema reside na anarquia que permite a crianças a livre utilização de páginas, de programas e de conteúdos, que deveriam ser estritamente para adultos", denuncia o autor do livro. Mas fará sentido proibir? A resposta é invulgarmente "não". As coordenadas para navegar na Internet são as mesmas para estar na vida.
Só que, sob a capa do anonimato, o grau de desinibição aumenta ou, como refere o sociólogo José Machado Pais, "em cada janela [virtual] é possível assumir distintas identidades, embora simultâneas." Há uma "estética de jogo de fantasia"que se aproxima do romantismo, acrescenta, onde o sentir predomina sobre o pensar. Como no amor e nas paixões fora das janelas virtuais. A diferença é que estes relacionamentos se podem apagar com o clicar de uma tecla: escape.
Outra diferença entre virtual e real é a ilusão, a falsa ideia de que, por ser virtual, o sexo na Internet não traz riscos, é "asséptico" porque os corpos estão ausentes. A advertência, sarcástica, vem curiosamente de alguém com o nick "Pirilau". Está na sala Blá Blá e dirige-se a outro alguém cuja identidade não é revelada: "Linda menina... já aprendeste a ver a diferença entre realidade e virtual. a seguir é a aula da ilusao-desilusao" (sic).
Será isso que terá de aprender "Urgência", outra adolescente que surge mais tarde na mesma sala: "oii, sou nina, alguém me carrega o telemóvel?? mando fotos nua, e das partes mais privadas, mostro-me na web a alguém???" (sic).
O anonimato dos chats garante "maior fluidez de comunicação, desprendida de comprometimentos", afirma José Machado Pais. "Na vida real, os mecanismos emocionais da vergonha e do ridículo dificultam as aproximações amorosas, desencadeando mecanismos de medo. Este medo é contornado quando, sempre sob anonimato, se buscam ligações ciberespaciais." É a circunstância comunicacional a fazer a diferença e a funcionar como garante de "salvação de face", mas apenas "até certo ponto", adverte ainda o sociólogo no livro Nos Rastos da Solidão (Ambar).
Gabriela Moita, psicóloga clínica, diz ter conhecimento de casos como estes. Jovens numa rede [Net] da qual não sabem como sair. Espécie de adição raramente confessada e cheia de possibilidades, muitas delas com riscos escondidos. "Nunca me foi apresentada como problema, mas apercebo-me dessa realidade na sequência de conversas." É o medo que as revela. Ou melhor, o medo da chantagem que inicialmente as cala, acaba por ser o mesmo que o psicólogo detecta. Gabriela Moita diz que nunca lhe apareceu no consultório nenhum pai com este tipo de preocupações. "Tanto quanto me parece, quando ocorrem, eles não têm conhecimento", justifica. A especialista acrescenta: "Normalmente têm a noção de que controlam; de que se forem ver o histórico dos sites consultados na Internet conseguem saber o que os filhos estão a fazer."
Fica a pergunta de Ricardo Montalvo: Saberiam os pais de M..., de 12 anos, que ela estava numa sala de chat às quatro da madrugada?|
* Os diálogos foram reproduzidos tal como estão no original
Pessoalmente acho que a notícia acima referida se relaciona com o artigo que se segue
fonte:MundoUniversitárioVidas Duplas: universitárias e prostitutas
Dinheiro rápido e fácil?
Universitárias «lindíssimas», «carentes», «fresquinhas» ou que prometem «levar à loucura» são alguns dos iscos usados para chamar a atenção dos clientes. O MU mordeu o anzol.
Por Lina Manso | lmanso@mundouniversitario.pt
Ilustração Bruno Franquet
Com o que facturam num único dia, elas chegam a pagar a renda do apartamento. E das entrevistadas, nenhuma deseja sair agora da prostituição.
«Não dou esse tipo de informações» ou «desculpe mas enganou-se no número» foram algumas das respostas obtidas quando o MU, sem esconder a intenção do telefonema (para fins de reportagem), fazia uma primeira abordagem. Contudo, entre muitas recusas, foram surgindo testemunhos de mulheres que «praticam o convívio» (como disse “Cila”, uma das entrevistadas), na capital. Tudo pelo telefone, sem exposições. Um mundo em que o receio de serem descobertas dita as regras.
200 euros num dia bom
“Carla”, lisboeta de 23 anos, é peremptória. «Não quero encontros», frisa, logo à partida. Frequenta o 2º ano de Direito e não pretende arriscar a possibilidade de vir a subir na carreira. «Imagina que agora nos conhecíamos e mais tarde nos cruzávamos em trabalho», começa a explicar. «Saberias o que eu tinha feito», conclui. “Carla” sente que tem de se proteger e não pode abrir excepções.
Fecha esta porta mas, assegurada a margem de segurança, não rejeita alguns minutos de conversa. Conta que partilha um apartamento com uma amiga de Psicologia e que ambas “andam na vida” até saírem dos respectivos cursos. «Os livros são caros e tenho de pensar nas propinas», refere. Consegue ainda guardar uma parte do rendimento. Afinal, «num dia bom», chega a receber 200 euros. Mas apesar de dizer que vai deixar aquela a chamam a mais velha profissão do mundo, afirma que «quando se aprende a ganhar dinheiro desta forma é mais fácil voltar atrás na decisão».
Entrou «há alguns meses» por sua livre iniciativa. «Comecei a atender telefones num apartamento» de prostitutas, diz. E acabou por ceder à ideia de dinheiro rápido. «Por um serviço completo – com anal incluído – cobro 50 euros», esclarece. Assegura também que não abdica da «protecção» e que os «beijos na boca são proibidos». “Deixa-los para o teu namorado?”, perguntou o MU, já sabendo que tinha uma cara-metade, a estudar em Aveiro. «Não é uma questão de romantismo mas de higiene!», diz “Carla”, que admite nunca ter sentido prazer durante o acto sexual com os clientes. «Nem me permitiria apaixonar por um deles!», sublinha. E entretanto, vai escondendo ao companheiro a verdade. «Ele nem sonha, pensa que trabalho na Vodafone», afirma. E apesar da mentira, para ela este é um meio igual a tantos outros para atingir o fim almejado, ou seja, o “canudo”.
Chega para todas!
A “Cila”, de 18 anos, frequenta o 1º ano de Psicologia, é de Lisboa, não tem namorado, e vive há alguns meses no apartamento de uma amiga mais velha que já “anda na vida há um ano”. Pouco depois aliou-se a ela. «A princípio foi complicado», admite. Agora já tem cerca de cinco clientes habituais, e nos melhores dias chega a ganhar 400 euros (cobrando entre 50 a 75 pelo serviço normal). Um valor que dá quase para pagar um mês de renda. «Não me considero uma consumista e tento amealhar para deixar isto daqui a dois anos no máximo», alega. Mas tem consciência de que sendo uma «maneira de conseguir dinheiro rápido (e não fácil!) há raparigas que se habituam ao nível de vida».
Já concorreu a cargos de auxiliar administrativa ou secretária e até agora nada. Virou-se para a prostituição. Ao menos, como trabalha «por marcações», pode ajustar os horários ao tempo que necessita para as aulas.
A futura psicóloga – que admite pretender vir a trabalhar com crianças ou criminosos – acredita que «as coisas muitas vezes acontecem quando não estamos à espera». Como o facto de ter vindo parar à “vida”. Adianta que conhece «pouca gente no meio» e fala em «alguma rivalidade» entre colegas de profissão. «Mas acho que chega para todas!», remata.
Habituada a ter dinheiro
A “Erika”, de 21 anos, e a “Sílvia”, de 20, são amigas, partilham o mesmo apartamento que arrendam por 750 euros e têm outro, por 500, onde trabalham. Mas também fazem «deslocações». Por cada uma, 150 euros.
A vantagem deste tipo de trabalho é que «não andamos sempre a contar os tostões», diz “Sílvia”, a frequentar o curso de Enfermagem. Afinal, «não é em qualquer emprego que se faz 200 ou 300 euros por dia. Além das despesas «dá para tudo o que quisermos». Mesmo seduzida pelo dinheiro, quando acabar o curso, sai. «Porque me custa».
“Erika”, do norte de Portugal, frequenta um curso «relacionado com teatro e cinema» e confirma que a prostituição «é a melhor forma de arranjar dinheiro rápido».
Ambas têm namorado, a quem garantem conseguir esconder as vidas paralelas: uma diz que faz uns “biscates”, outra que trabalha em hotelaria. E todos os dias, dependendo das aulas, fazem «pelo menos alguns serviços, sempre com «protecção». Concorreram a outros trabalhos mas ou não obtinham respostas ou os salários oferecidos eram baixos. Entretanto, “agarram-se” à prostituição e dizem, com orgulho, nunca ter recebido queixas dos clientes.
Eu não sou universitária!
No anúncio de jornal, “Sofia”, de 24 anos, refere que frequenta o 2º ano de Medicina. Ao MU, afirma que apenas o diz por ser algo que «agrada ao homens».
É do Porto mas veio com os pais para Lisboa. Ainda mora com eles. «Pensam que tomo conta de uma senhora», explica. E todos os dias, «normalmente entre as 13 e as 21 horas», dirige-se ao apartamento que arrenda com uma amiga por 440 euros. Confessa que não é fácil: «estamos com pessoas estranhas e fazemos muitas vezes coisas de que não gostamos». Mas «os trabalhos lá fora não dão dinheiro e as entrevistas a que fui não deram em nada». Por enquanto, vai aproveitando para organizar a sua vida. «Estou a tentar comprar uma casa», afirma. E julga que daqui a um ano já terá as contas mais equilibradas. Nessa altura «saio disto», refere.







